"O conflito, que refletia a divisão do mundo entre capitalismo e comunismo, fermentava desde o início da década de 60, ganhou as ruas e teve seu desfecho com a intervenção militar"
Na madrugada do dia 31 de março de 1964, um golpe militar foi deflagrado contra o governo legalmente constituído de João Goulart. A falta de reação do governo e dos grupos que lhe davam apoio foi notável. Não se conseguiu articular os militares legalistas. Também fracassou uma greve geral proposta pelo Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) em apoio ao governo. João Goulart, em busca de segurança, viajou no dia 1o de abril do Rio, para Brasília, e em seguida para Porto Alegre, onde Leonel Brizola tentava organizar a resistência com apoio de oficiais legalistas, a exemplo do que ocorrera em 1961. Apesar da insistência de Brizola, Jango desistiu de um confronto militar com os golpistas e seguiu para o exílio no Uruguai, de onde só retornaria ao Brasil para ser sepultado, em 1976.

Nos primeiros dias após o golpe, uma violenta repressão atingiu os setores politicamente mais mobilizados à esquerda no espectro político, como por exemplo o CGT, a União Nacional dos Estudantes (UNE), as Ligas Camponesas e grupos católicos como a Juventude Universitária Católica (JUC) e a Ação Popular (AP). Milhares de pessoas foram presas de modo irregular, e a ocorrência de casos de tortura foi comum, especialmente no Nordeste. O líder comunista Gregório Bezerra, por exemplo, foi amarrado e arrastado pelas ruas de Recife.





Os militares que assumiram o poder em 1964 acreditavam que o regime democrático que vigorara no Brasil desde o fim da Segunda Guerra Mundial havia se mostrado incapaz de deter a "ameaça comunista". Com o golpe, deu-se início à implantação de um regime político marcado pelo "autoritarismo", isto é, um regime político que privilegiava a autoridade do Estado em relação às liberdades individuais, e o Poder Executivo em detrimento dos poderes Legislativo e Judiciário.
Já no início da "Revolução" ficou evidente uma característica que permaneceria durante todo o regime militar: o empenho em preservar a unidade por parte dos militares no poder, apesar da existência de conflitos internos nem sempre bem resolvidos. O medo de uma "volta ao passado" (isto é, à realidade política pré-golpe) ou de uma ruptura no interior das Forcas Armadas estaria presente durante os 21 anos em que a instituição militar permaneceu no controle do poder político no Brasil. Mesmo desunidos internamente em muitos momentos, os militares demonstrariam um considerável grau de união sempre que vislumbravam alguma ameaça "externa" à "Revolução", vinda da oposição política.
A falta de resistência ao golpe de 1964 não deve ser vista como resultado da derrota diante de uma bem articulada conspiração militar. Foi clara a falta de organização e coordenação entre os militares golpistas. Mais do que uma conspiração única, centralizada e estruturada, a imagem mais fidedigna é a de "ilhas de conspiração", com grupos unidos ideologicamente pela rejeição da política pré-1964, mas com baixo grau de articulação entre si. Não havia um projeto de governo bem definido, além da necessidade de se fazer uma "limpeza" nas instituições e recuperar a economia. O que diferenciava os militares golpistas era a avaliação da profundidade necessária à intervenção militar.
Desde o início havia uma nítida diferenciação entre, de um lado, militares que clamavam por medidas mais radicais contra a "subversão" e apoiavam uma permanência dos militares no poder por um longo período e, de outro lado, aqueles que se filiavam à tradição de intervenções militares "moderadoras" na política – como havia acontecido, por exemplo, em 1930, 1945 e 1954 – seguidas de um rápido retorno do poder aos civis. Os mais radicais aglutinaram-se em torno do general Costa e Silva; os outros, do general Humberto de Alencar Castelo Branco.
Articulações bem-sucedidas na área militar de um grupo de oficiais pró-Castelo e o apoio dos principais líderes políticos civis favoráveis ao golpe foram decisivos para que, no dia 15 de abril de 1964, Castelo Branco assumisse a presidência da República, eleito, dias antes, por um Congresso já bastante expurgado. O novo presidente assumiu o poder prometendo a retomada do crescimento econômico e o retorno do país à "normalidade democrática". Isto, no entanto, só ocorreria 21 anos mais tarde. É por isso que 1964 representa um marco e uma novidade na história política do Brasil: diferentemente do que ocorreu em outras ocasiões, desta vez militares não apenas deram um golpe de Estado, como permaneceram no poder.




Celso Castro
Para saber mais:
- Sugerimos a leitura dos verbetes que se encontram disponíveis no Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro: Atos Institucionais, Ligas Camponesas, Revolução de 1964, Comício das Reformas, Marcha da família com Deus pela liberdade.
- Outros documentos e informações relacionadas ao assunto estão disponíveis on-line. Basta realizar a consulta em nossa base de dados Accessus.Dica: na consulta, escolha o arquivo Paulo Nogueira Batista, clique no tipo de documento desejado (se quiser ver fotos escolha AUDIOVISUAL), selecione no campo assunto palavras ligadas ao tema (por exemplo, Revolução de 1964) ou aos personagens envolvidos e em seguida execute a pesquisa
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